A História da Emigração Portuguesa
Em 1978, Vitorino Magalhães Godinho considerou a emigração uma “constante
estrutural” da demografia portuguesa, cujo volume de saídas terá atingido
níveis sem precedentes entre meados do século XIX e a década de 70 do
século XX. Mesmo nos últimos três decénios, o fluxo emigratório português não
parou – corresponderá a um número inferior de saídas (entre 20 000 e 27 000
indivíduos por ano, nos inícios do século XXI), assumirá um carácter mais
temporário, será caracterizado por uma maior diversidade e até descobriu
“novos” destinos (e.g. Grã-Bretanha). E depois, mesmo que o fluxo emigratório
se tenha atenuado, subsiste a condição diaspórica dos portugueses – mais de
4,5 milhões de nacionais e luso-descendentes espalhados por uma miríade de
países dos cinco continentes (equivalentes a cerca de 40% dos residentes em
território nacional!) -, avivada continuamente pelas remessas que continuam a
chegar (ainda hoje, cerca de 2% do Produto Interno Bruto), pelas
comunicações constantes (telefónicas, televisivas, postais…), pelas visitas que
animam e transformam tantos lugares do interior de Portugal continental e das
regiões autónomas…
Se é verdade que Portugal se transformou, no início dos anos 90, num “país de
imigração”, uma vez que os fluxos de entrada de estrangeiros passaram a
suplantar as saídas de portugueses para o exterior, não é menos verdade que
o pequeno Estado Ibérico continua a ser um “país de emigrantes”. É que os 4,5
milhões de compatriotas (ou descendentes destes) a residir no estrangeiro, são
mesmo muita gente, e gente das nossas famílias… afinal, os nossos “tios da
América”, “primos da França” ou “amigos da Inglaterra”! Afinal, se no período
contemporâneo a emigração assume um carácter bem menos estrutural na
demografia portuguesa, ela continua a marcar o nosso imaginário colectivo e a
nossa sociedade.
Infelizmente, o discurso académico, jornalístico e sobretudo político do último
decénio, tem remetido, progressivamente, a emigração e os emigrantes
portugueses, para uma espécie de recanto da história, uma nota de rodapé
colocada nas notícias de Verão dos jornais e telejornais nacionais, onde a
imigração e as comunidades imigrantes instaladas em Portugal assumem uma
visibilidade muitíssimo maior. É este apagamento da emigração que a iniciativa
da RTP “EI-LOS QUE PARTEM” A História da Emigração Portuguesa, em
boa hora vem contrariar.
Esta série de cinco documentários explora os traços fundamentais que
caracterizam os três ciclos da emigração portuguesa.
Os três primeiros programas, realizados por Jacinto Godinho, incidem
sobre o ciclo transoceânico, que se prolonga de meados do século XIX até aos
anos 30 do século XX. O Brasil e os Estados Unidos, destinos dominantes
destes emigrantes, funcionam como os espaços de referência, sendo retratado
o carácter definitivo desta emigração, as experiências pioneiras no Oeste
americano e nos cafezais brasileiros, assim como o estabelecimento de
“colónias” e a criação, por parte dos próprios emigrantes, de uma rede de
estruturas de apoio social (associações, bibliotecas, hospitais…), sobretudo
nítida no Brasil. Para estes programas foi efectuada uma investigação
documental profunda, que inclui imagens e informações escritas inéditas, que
acrescentam informações novas à “história já conhecida”.
Fernanda Bizarro realizou o quarto documentário que nos posiciona no
contexto do ciclo Europeu (finais dos anos 50-1973/74), período em que mais
de um milhão e meio de portugueses abandonaram o país. A França, destino
claramente dominante, funciona como referência espacial e a “história” do
episódio transporta-nos do Portugal da ditadura, politicamente fechado e
marcadamente rural, onde a transição para uma economia moderna não
conseguia criar um número suficiente de novos empregos, para o destino
francês, onde a plena expansão económica implicava o recrutamento de
trabalhadores para funções pouco qualificadas na indústria transformadora, na
construção civil ou no emprego doméstico. As experiências da emigração
clandestina, o funcionamento das redes de recrutamento baseadas em
conterrâneos, as dificuldades residenciais e a mobilidade social das mulheres
emigrantes são retratados neste documentário, que ainda nos leva a
dimensões mais recentes, como a manutenção dos laços com Portugal,
designadamente ao nível local. Tratando do período da emigração que mais
marca o imaginário colectivo das gerações ainda vivas, este programa fornece
um olhar novo e diferente sobre uma realidade incontornável da história
portuguesa das décadas de 60 e 70 do século XX.
que se afirmaram na sequência da emigração para França. De certo modo,
pode ser classificado como um “programa de transição”, uma vez que mostra
como o destino francês permitiu derivações para outros países, que se foram
mantendo como destinos relevantes no 3º ciclo contemporâneo da emigração
portuguesa (pós-inícios dos anos 80 do século XX). Neste caso, o Luxemburgo
é a referência, sobretudo pela visibilidade e pelo significado da população
portuguesa no Grã-ducado (mais de 15% dos residentes). Abordam-se
questões como o empresarialismo dos emigrantes portugueses, o significado
da 2ª geração e as suas ligações a Portugal, o carácter temporário dos
movimentos mais recentes ou a manutenção dos referenciais identitários que
passam pela religião católica, o futebol, o folclore e a música. Ao abordar uma
realidade que estabelece a continuidade entre o passado recente (do “país de
emigração” propriamente dito) e o presente (do “país de imigrantes com
milhões de emigrantes e descendentes”), este programa apresenta a força do
documentário-vivo e abre a porta para o quadro económico e social da
emigração portuguesa dos dias de hoje.
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